Butão, a terra da felicidade

Giuliana Preziosi para a Revista Plurale
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Antes de conhecer o Butão, estava curiosa para entender como é a vida em um país que mede seu desenvolvimento com um Índice de Felicidade Interna Bruta. Cheguei no aeroporto toda ansiosa querendo saber mais sobre isso, e um guia me perguntou: “O que é felicidade para você?”
Em 1972, o 4º Druk Gyalpo declarou que a métrica para medir o progresso do país seria o GNH (Gross National Happiness) ou FIB: Felicidade Interna Bruta. Ele acreditava que, dentro de um período de 5 anos, se seu povo não fosse mais feliz do que antes da implementação do índice, seu plano teria falhado. A métrica foi sendo aprimorada e um conjunto de indicadores mais preciso vem sendo usado desde 2008.

 

E ai vem a pergunta: Como medir felicidade? O GNH possui uma abordagem multi-dimensional que visa atingir o equilíbrio entre as necessidades atreladas ao bem estar material, espiritual, emocional e cultural, presentes na sociedade. O conceito é pautado na crença de que felicidade pode ser alcançada por meio do equilíbrio das necessidades do corpo e da mente, em um ambiente seguro e tranquilo, diferente do sentimento momentâneo que sentimos quando algo bom acontece, pois é passageiro.

O GNH tem 4 grandes pilares e resolvi aproveitar nossa viagem para observar como estes pilares influenciam o modo de vida no Butão.

O primeiro pilar é o Desenvolvimento Sustentável. Com um conceito tão complexo e abrangente como este, perguntei ao nosso guia o que era considerado desenvolvimento sustentável para o Butão e ele me respondeu explicando que o Rei dá 5 hectares de terra para cada cidadão butanês e cabe a cada um construir sua casa, plantar sua comida, cuidar de seu espaço e seguir sua vida. O governo providencia o básico e dá condições para que todos tenham acesso ao necessário, mas o esforço para manter o que é seu e crescer, depende de cada um.

A educação e assistência médica é gratuita e oferecida para todos. No entanto, para entrar na universidade, por exemplo, ou conseguir uma bolsa de estudos fora do país, o aluno passa por um teste e precisa ter uma nota mínima para ser aceito.

O segundo pilar é a Preservação e Promoção da Cultura. Desde de seu modo tradicional de se vestir até os festivais que ocorrem todos os anos em diferentes cidades, este item é fascinante de ser observado. Há muitos festivais no Butão e praticamente cada distrito tem o seu, mas cada um ocorre em uma época diferente do ano.
Estávamos em Paro durante seu festival, o Paro Tshechu. São 4 dias de festival com música e dança o dia todo. Mas não pensem que é só uma grande festa, pois tudo tem um significado. Na maioria das danças são usadas máscaras que simbolizam os espíritos a serem encontrados após a morte. Eles utilizam as danças como forma educativa de preparar as pessoas para o que elas encontrarão em outros planos.

O lugar onde ocorre o festival estava lotado mas, mesmo assim, não havia confusão e cada um tinha seu espacinho para sentar, mesmo que bem apertadinho. Além disso, por ser uma atividade solene, cada um usa a sua melhor roupa, sendo que para os homens o tradicional “Gho” e para as mulheres, a “Kira”, que geralmente são bem coloridas.

Conservação do meio ambiente é o terceiro pilar. Segundo dados do Climate Action Tracker, as emissões de GEE (gases de efeito estufa) do Butão são desprezíveis, visto que implicam menos de 2,23 Mt CO2 -e (dados de 2010), o que corresponde a cerca de 3 MtCO2 -e per capita. Mesmo com as progressões que indicam aumento das emissões ao longo do tempo devido ao crescimento econômico, o país investe em se tornar carbono neutro. Claro que é um país pequeno, com apenas 700 mil habitantes, mas tem cidades com menos do que isso que tem uma pegada de carbono muito maior. Além disso, o espirito comunitário dá o exemplo, pois é comum organizarem mutirões de limpeza em suas vilas. A matriz energética do país é hidráulica e, também, a principal fonte de renda do país, pois exportam energia para a Índia e pra o Nepal.

Tivemos a oportunidade de visitar a 1ª Royal Bhutan Flower Exhibition. Para comemorar o aniversário de 60 anos de seu pai, o Rei organizou essa exposição com objetivo de promover a aprendizagem e o envolvimento com a natureza, além de encorajar a criação de mais espaços verdes em áreas urbanas, e olha que não faltam espaços verdes por todo o país.

E, ainda, outro fato curioso é que a parte do Himalaia que fica em território butanês é a única intocável até hoje, por ser uma região considerada sagrada, onde é proibida, inclusive, a entrada do próprio povo do país.

O quarto pilar é a “Boa Governança” e esse é um exemplo que vários governos deveriam imitar. Apesar de ser uma monarquia, as decisões são tomadas de forma bastante democrática. Duas vezes por ano ocorre a Assembleia Nacional, quando o Rei, o Primeiro Ministro e o Parlamento se reúnem para discutir o andamento do país.
Toda Assembleia, que tem duração de um mês, é transmitida pela TV local e as pessoas realmente acompanham, porque no final do dia, um dos parlamentares vai em um programa de televisão do canal local, para uma entrevista aberta onde as pessoas podem ligar fazendo perguntas e comentários sobre o que está sendo discutido. Se algo causa descontentamento da população, volta para discussão.

Todas as pessoas que conversamos adoram o seu jovem Rei, que tem apenas 35 anos, e o vêm como um grande líder, seguindo o exemplo de seu pai. Algumas pessoas nos contaram que o Rei não para em seu gabinete, pois está sempre circulando pelo país, visitando os vilarejos, as cidades, e conversando com as pessoas para ver os pontos a serem melhorados em seu governo. É comum encontrar quadros do Rei e da família real em todos os lugares.

Os 4 pilares se desdobram em 9 princípios, que são a base para os indicadores do GNH. Uma pesquisa é feita anualmente para mensurar esses indicadores e avaliar o desenvolvimento do país. Para conhecer mais sobre os indicadores e sua metodologia, uma ótima fonte é o site do Centro de Estudos do Butão (www.bhutanstudies.org.bt).

Os nove princípios do Índice de Felicidade Interna Bruta no Butão são:

  1. Padrão de vida
  2. Educação
  3. Saúde
  4. Diversidade cultural e Resiliência
  5. Vitalidade da comunidade
  6. Uso e equilíbrio do tempo
  7. Bem estar emocional
  8. Vitalidade e diversidade do ecossistema Boa governança

Conhecer o Butão foi diferente de qualquer viagem que já tínhamos feito, e olha que estamos viajando pelo mundo. Lá vimos: trabalhadores contentes com seu trabalho, famílias reunidas se divertindo, pais educando seus filhos, pessoas com orgulho do governo do País, crianças rindo e brincando com a gente mesmo sem entender o que falávamos, jovens compenetrados em seus estudos e orgulhosos de mostrar o que estavam aprendendo, monges atenciosos e simpáticos, voluntários ajudando na organização do festival, jovens da comunidade auxiliando os policiais (com jaquetas dizendo “Amigos da Polícia”), pessoas fazendo mutirão para limpar o lixo das ruas, idosos sempre nos cumprimentando com um sorriso, ruas sem semáforos com o trânsito funcionando muito bem, pessoas trabalhando arduamente nas plantações de arroz, mas com um sorriso no rosto disposto sempre a dizer um “olá”, orgulho e valorização da cultura local, respeito ao meio ambiente, fé e espiritualidade. E, agora, pergunto: O que é felicidade para você?

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